sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Privatização da REN - O PS no seu pior

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O Estado Português detém actualmente 51% do capital da REN – Redes Energéticas Nacionais, SGPS, através das participações da Caixa Geral de Depósitos e da Parpública. Diga-se, aliás, que a estrutura accionista da REN incluía apenas o Estado Português e a EDP até final de 2006, altura em que o governo do Partido Socialista achou por bem dar início a um processo de gradual privatização da empresa.

Como bem sabemos, a REN opera num mercado onde não existe e onde jamais existirá concorrência - um monopólio natural. De facto, a REN é a empresa responsável pelo transporte de electricidade em muito alta tensão e pelo transporte de gás natural em alta pressão. Opera, portanto, um sistema de redes de transporte de energia que é e continuará a ser o único do país. É uma infra-estrutura verdadeiramente estratégica, porque da sua adequada operação e manutenção depende, literalmente, a vida de todos os portugueses.

Ao longo dos tempos mais recentes, a REN tem sido um verdadeiro case study de boa gestão pública, gerando sucessivamente resultados positivos e contribuindo directamente com os seus lucros para o orçamente do Estado. A título de exemplo, refira-se que em 2006 o resultado líquido consolidado do grupo foi de 550 milhões de euros!

Não há portanto, mesmo na análise de alguém que se considera liberal no domínio económico, uma única razão válida para se insistir na privatização da REN. Trata-se, como já se disse, de um sector de actividade muito particular, onde jamais existirá concorrência, onde não existirá um mercado, pelo que os cidadãos nada têm a ganhar com a passagem destes activos para as mãos dos grupos privados do costume. Pelo contrário, muito teríamos a perder se a privatização resultasse numa estratégia de gestão com objectivos de curto prazo, que iria provavelmente descurar o investimento nas redes, pondo em risco a segurança do abastecimento energético do país.

Então porquê a ideia da privatização?

Há, desde logo, um interesse político imediato. A privatização resultaria num encaixe financeiro apreciável, que permitiria atenuar o défice público e constituiria, nessa medida, um óbvio trunfo político para o governo. É, evidentemente, uma tentação que deve ser denunciada, porque sujeita os interesses vitais do país a uma lógica partidária de curto prazo.

A segunda razão para que a febre privatizadora do Partido Socialista tenha apanhado a REN pelo caminho é ainda menos edificante que a primeira. É sabido que alguns grupos económicos – os suspeitos do costume – salivam perante a possibilidade de deitar mão a uma empresa que é necessariamente lucrativa. Um negócio garantido. E é sabido que esses grupos se movimentam com agilidade e reconhecida eficácia junto dos meios políticos.

Até à passada 3ª feira, era óbvio que o governo socialista tinha caído em tentação. Fosse por uma, fosse por outra, quem sabe se pelas duas razões acima apontadas. Leia-se a resolução do Conselho de Ministros n.º 74/2007, de 1 de Junho, através da qual foi lançada a primeira fase de privatização da REN. Diz-se nessa resolução, textualmente, que “...estão reunidas as condições para que, a curto prazo, se possa proceder à realização de uma ou mais fases de privatização do capital social da REN, caso em que, não obstante a redução da sua posição accionista, o Estado continuará ainda a dispor das respectivas competências no plano regulatório e a título de entidade concedente”. O caminho estava traçado, sem margem para dúvidas!

É por isso verdadeiramente surpreendente que no debate mensal da passada 3ª feira, na Assembleia da República, o Primeiro-Ministro tenha afirmado que "a REN é pública e manter-se-á pública", lembrando que "o Estado tem uma participação de 51% e não diminuirá essa participação, justamente por ser uma empresa estratégica". Brilhante. Será que alguém confrontou o Primeiro-Ministro com esta tão flagrante cambalhota política?

Saúda-se a mudança de rumo, mas é inquietante que o governo não tenha uma estratégia definida para um dos sectores mais estratégicos do país. Que o governo brinque às taxas para os sacos de plástico ainda vá que não vá, mas brincar com um assunto tão sério como o futuro da REN ultrapassa o limite da razoabilidade. Haja bom senso e seriedade!

João Castanheira

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