quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Uma viagem pelo maravilhoso que ainda há em nós

.
Apanhar o comboio na Covilhã às seis da tarde de um dia de Verão a caminho de Lisboa é passar 4 horas a viajar pelo maravilhoso que ainda há em Portugal.

Quando, entre o último quartel do século XIX e o primeiro do século XX, se construíram algumas das mais belas linhas de caminho de ferro em Portugal, aproveitando, em muitos casos, as “estradas” deixadas pelo rios, construiu-se um património único que faz com que uma simples viagem de comboio se transforme num prazer indescritível.

Ao sair da Covilhã e após contornarmos a Serra da Gardunha, com as suas cerejeiras do outro lado da janela, avançamos ao longo da Beira Baixa a caminho das águas do Tejo que nos surgem, após a estação de Ródão, enquadradas numa beleza inigualável por dois gigantes de rocha que dão pelo nome de Portas de Vila Velha de Ródão. Apesar de já há alguns quilómetros o Tejo ter chegado a terras portuguesas é ali, naquele pedaço assombroso de natureza, que nos entra portas a dentro e se espraia a caminho da planície ribatejana até encontrar Lisboa e o mundo.

A partir dali é uma paisagem de cortar a respiração que nos vai passando pela janela, desde as encostas abruptas ao rio que corre manso até à primeira barragem, a do Fratel, são quilómetros de natureza que nos enchem os sentidos. Depois do Fratel, o rio estreita e torna-se, por alguns momentos, torrencial. As águas, sob o olhar dos Grifos que por aqui ainda cruzam os céus, lá vão até que a mansidão anunciada de Belver lhes abraça os ímpetos para pouco depois as libertar a caminho de Abrantes para onde correm sob o olhar atento da central do Pego e se lançam, pouco depois, para essa ilha fantástica e altaneira, que qual farol do mundo, em Almourol, guarda o Tejo e guarda a nossa memória.

Daqui para a frente é a planície que se abre diante de nós, quilómetro a quilómetro, enquanto no fim do horizonte o Sol parte para ocidente e a noite se deixa cair sobre Lisboa.

Viajar de comboio é ainda um enorme prazer que aos poucos e pela estupidez dos homens neste rectângulo sobranceiro ao Atlântico se vai tornando uma miragem. Aproveitem e conheçam o maravilhoso que ainda vos pode entrar pela janela ao vosso lado antes que outra locomotiva algures descarrile e descarrile também toda esta inigualável herança que os nossos avós nos deixaram.

Luís Isidro Guarita

Sem comentários: